domingo, 13 de outubro de 2013

leituras

Insultei-me várias vezes por nunca ter aprendido a fazer ligações directas com o pessoal da terra que andava aos tractores. Erros que se cometem quando se é novo e não se percebe que é preciso aprender de tudo. Prometi-me levar o miúdo à terra um dia e ensinar-lhe a matar um porco, varejar azeitonas, pegar fogo à mata, roubar vinho, roubar galinhas, encontrar o caminho para casa embriagado, sem luzes, levado pelo cheiro das cabras, ganhar à sueca, fazer fisgas, fugir à guarda, não comer fruta do chão, reconhecer o caminho das pedras no rio, sacar moças nos bailes, mudar o óleo, tirar água do poço e uma bezerra da barriga da mãe, levar uma galheta sem chorar nem baixar os olhos, fazer corridas de tractor, baldar-se à missa sem dar nas vistas, aliviar as caixas das esmolas e as hóstias do sacristão, ir aos caracóis e às amoras, marcar terras, tudo aquilo que faria dele um homem melhor, mais preparado. Coisas que só se aprendiam na terra, nos meses eternos de Verão. 

Ricardo Adolfo, Depois de morrer aconteceram-me muitas coisas

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