A distância entre aquilo que representamos e o que somos na imagem fixa prende-se, essencialmente, com a vontade de ver para além de. O reflexo, continuamente ambíguo, tanto pelo movimento que é capaz de reproduzir, como pelo diálogo interior que permite manter, sempre me pareceu mais fiel do que a imagem captada. No instante cristalizado vejo-me, mas não me reconheço. A frustração de estar ali fielmente representada sem ser eu, lembra-me sempre a história que ela acabou por me contar sem saber muito bem porquê: tinha um alter-ego. Tinha outro nome, escolhia vestidos muito femininos, mudava o cabelo, fumava de forma afectada (usava boquilha?) e gastava dinheiro - ela uma rapariga de gostos simples, sem grandes manias, com um alter-ego daqueles. Dizia, com tanta franqueza que nunca cheguei a duvidar da história, que havia dias que era outra e nada fazia contra isso, assumia-o através de conjunto de rituais que nada tinham a ver com ela e passeava-se pela cidade.
O auto-retrato surge invariavelmente falhado, a sensação de estar a fotografar o meu doppelgänger entranha-se.
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