segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

As razões para votar sim no próximo referendo sobre a despenalização do aborto são simples e conhecidas de todos, talvez por isso a campanha do "sim" não esteja a ter um impacto tão grande quanto a campanha do não:
uma mulher que escolha fazer um aborto não deve ser presa, não deve ser marginalizada pelo sistema de saúde, deve ter direito a aconselhamento médico, deve ter o direito a tomar a sua decisão dentro e com o apoio da sociedade de que faz parte - deve-lhe ser permitido manter a sua dignidade.

Mas não foi pelas razões que me fazem ir votar sim que decidi escrever, foi antes pela campanha levada a cabo pelos diferentes movimentos do "não", que me parece, no mínimo, hipócrita.
Então é agora que estes movimentos aparecem reivindicando medidas alternativas de combate aos abortos clandestinos? Quando é que estas pessoas se mobilizaram para reivindicar apoio para as famílias com problemas económicos, para as mães adolescentes, para maior investimento no planeamento familiar ou na educação sexual nas escolas?
É agora, quando se pergunta, em referendo, se quem faz um aborto deve ser penalmente responsabilizado, que estas pessoas decidem que devem intervir, pedindo às pessoas para manterem o status quo, mas não resolvendo o problema em questão?
Onde está a intervenção na sociedade civil quando esta é realmente precisa?
Da última vez o referendo não foi vinculativo pois mais de metade do eleitorado não foi votar, no entanto a mobilização pelo não foi tal que o número de votos pela manutenção da lei ultrapassou o número de votos pela sua mudança. Isto levou a alguma discussão pública sobre como resolver os abortos clandestinos, sobre como dar apoio a quem não queira manter uma gravidez? Não, muito rapidamente estes movimentos se remeteram ao silêncio. Afinal talvez ignorar o problema o faça desaparecer...
Mais do que o voto no "não" o que eu não suporto são os movimentos pelo "não" - que aparecem como sendo moralmente imaculados.
Cantam, recitam poemas, apelam ao nosso lado mais sensível e até defendem que no fundo, no fundo são contra mandar mulheres para a prisão; mas desde que me lembro que a lei está do lado deles e sinceramente não vi estas pessoas empenhadas em algo mais do que manter o que temos, empenhadas em mudar a situação insustentável que representam os abortos clandestinos no nosso país.

2 comentários:

Fred disse...

Queria por aqui um comentário, e tenho andado as voltas com aquilo que ia dizer...não consegui, então pedi emprestadas umas palavras a Oscar Wilde, que vou colocar no meu blog!

O Meu Outro Eu Está a Dançar disse...

dou-te toda a razão! infelizmente a campanha do "não" está a confundir a real questão puxando ao lado sentimental de quem querem convencer... a questão é passar a controlar uma situação que sempre aconteceu clandestina, e que por assim o ser fragiliza (mais do que o próprio aborto já tem de fragilizador) as mulheres que optam por fazê-lo. Dizer não, não é defender mais a vida que os que dizem sim, é fechar os olhos a uma realidade que vai continuar a acontecer, nos mesmos parâmetros já conhecidos, sob um conjunto de ideias que, para mim, são moralistas, ilusórias (no que diz respeito ao apoio que agora, se diz passar a haver) e que ignoram as condições de vida a que algumas mulheres estão sujeitas. Porque esta questão, no fundo, é importante para elas e para a vida de muitas crianças (indesejadas ou "inconvenientes"). As mulheres que têm mais condições financeiras podem continuar a ir a Espanha e voltar...